quarta-feira, 5 de agosto de 2015

8º dia - De Navarrete a Azofra

23,8 km de caminhada

Mais uma vez levanto-mo-nos antes dos outros peregrinos, preparámos o pequeno-almoço e inundámos a cozinha com o cheiro de omeletes para o almoço... bem que nos gabaram o almoço.
De manhã fizemos o  aquecimento com Yoga à porta do albergue e seguimos rumo a Azofra... 
o inicio de caminhada ia fresco, com algumas gotinhas de chuva pelo meio... O percurso fez-se até Ventosa perto de quintas com vinhas... um percurso calmo e bom de se fazer com chuva... pois não tem muito arvoredo...

o caminho ainda ia a pouco mais de 5 km... e comecei a sentir a cabeça a andar a roda... com tonturas... ainda peguei num chocolate, não fosse uma hipoglicémia (baixa de açúcar) e reverteu um bocadinho, mas pouco depois a cabeça voltou a andar a roda.
Como tinha comido bolachas com iogurte e banana, o açúcar foi consumido rapidamente,... precisava de hidratos de carbono lentos (que há no pão, massa ou arroz)... lá fui ingerindo algumas doses de chocolate até chegar à ventosa... aí tive de parar no primeiro café para comer o meu 2º pequeno almoço.. e que sorte... como não há padaria, ainda apanhamos a carrinha que passa para vender pão... já recomposta fomos até Nájera.

Aqui perdemos de vista o nosso amigo Filipino... esperemos que tenha chegado ao seu destino 




A chuva ia sempre caindo e o trajecto tornou-se difícil pela lama que se ia acumulando. Os pés colam-se ao chão e quase que chego a ficar sem ténis. O Bruno diz entre-dentes que devia ter comprado uns bastões para andar sobre a lama (efectivamente diminuem o peso sobre as costas. Este link é interessante sobre o uso correcto dos bastões). E um pouco  mais à frente um casal da América do sul atenciosamente viu um galho e deu-o ao Bruno para que ele se aguentasse por entre o lamaçal... o caminho também é isso.. ajudar o próximo =)




Em Nájera aproveitámos para reabastecer-mo-nos, almoçar e seguir caminho até Azofra. O tempo ficou um pouco melhor depois de almoço e o caminho até Azofra não tem muito declive... mas mesmo assim, conseguimos ser dos últimos do grupo que nos tem vindo acompanhar... o amigo "Paco" fez uma festa assim que nos viu chegar...




O albergue municipal de Azofra é uma preciosidade... com quartos duplos, permitem ter uma noite mais descansada, sem o ressonar do vizinho do lado =)  à entrada tem uma pequena fonte, que torna o albergue muito bonito.

E mais uma vez cozinhamos algo no albergue...  como tinha estado todo o dia com fome... tive uma ataque de fúria antes do jantar... =( também eu fico de mau humor quando tenho fome... não sei como seria se jejuasse.. e acho que ainda fiquei mais magoada com o Bruno, porque enquanto eu tratava da roupa, alguém lhe deu massa com tomate para ele petiscar... e fiquei tão triste de ele não se ter lembrado de mim... e ter partilhado comigo... e com a fome com que eu estava, acabei por me chatear... desta vez não tínhamos muita opção na mochila e o Bruno fez um arroz de atum... que estava a saber a nada... foi mesmo bom para terminar o dia... Atum, arroz e chateada... o que me restava? pernas para continuar a andar...

quarta-feira, 24 de setembro de 2014

7º dia - Torres del Rio a Navarrete

33,4 km de caminhada.

Acordar cedo custa-me muito. Sorte é que o Bruno não se importa de acordar antes do sol raiar e levanta-se primeiro para preparar o pequeno-almoço. Temos comido logo pela manhã 2 iogurtes com bolacha maria & fruta e um capuccino instantâneo [e pão, quando há]. Ficamos logo bem nutridos. A habitual rotina de preparar as mochilas, o aquecimento dos músculos (isto tem sido essencial para evitar dores musculares durante a caminhada e o estiramento ao final do dia também se revela muito importante) e prontos para mais um dia. Hoje temos alguma dificuldade. Até Navarrete são cerca de 33 Km e as localidade são apenas de 10 em 10 Km. 1º Viana a 11km, seguida de Logroño a 9,2 km e por fim Navarrete a 13 km. O objectivo é chegar à hora de almoço a Logroño e os últimos 13 km fazermos da parte da tarde.

O sol ainda não tinha nascido quando deixamos Torres del rio. E uma coisa importante é não deixar de olhar para trás. Encontramos belas paisagens. Um pouco como na vida, somos o que somos agora, porque aprendemos ao longo da vida. Não um lamento ao que já passou, mas antes agradecimento ao que nos proporcionou.

Olhar para trás e ver Torres del Rio
O inicio da caminhada é subida de montes. Mas fico grata de ser logo nos primeiros Km. Pela manhã, ainda frescos, o caminho é sempre mais fácil. A subida não é intensa subimos dos 400 aos 600m de altitude.Seguimos quase sempre por caminhos de gravilha (que os ossinhos dos pés do Bruno agradecem) até Viana e assim que Vi Viana, adorei. Aqui parámos para comer algo e beber café. Passamos numa pequena padaria e o cheiro a pão quente inundou-me o olfacto. O sorriso daquela padeira alegrou-me a alma. O cuidado era extremo na forma de atender. Acho que gostava do que fazia. Seguimos caminho até Logroño foi fácil a caminhada até lá com uma descida suave. 
Apesar do tempo nublado que facilita a caminhada não podemos deixar de nos hidratar. Verdade que para mim durante as caminhadas parece que não consigo beber água. Opto por beber Aquarius [que no caminho é fácil de encontrar] para manter sempre hidratação e repor electrólitos importantes para os músculos.

'Aquarius a hidratar peregrinos'

À chegada a Logroño, perto do meio-dia fizemos mais uma pausa para almoçar, mais um vez com o pão que compramos e sentámo-nos à beira do rio Ebro. A paragem foi curta, pois ainda nos faltam 13 Km até Navarrete. Atravessamos Logroño e quase a saída desta pelo Parque de La Grajera encontrámos um Peregrino ao 'revés'. Olho para eles como Mestres. Este Peregrino já tinha feito o caminho vezes sem conta e desta vez, após chegar a Finisterra decidiu percorre-lo ao contrário. Creio ser mais solitário, apesar de encontrar inúmeros peregrinos a caminho de compostela. Partilhámos minutos de conversa para conhecer as histórias uns dos outro e desejar bom caminho... não só até Santiago, mas pela vida.


Monumento aos peregrinos em Logroño

A saída de Logroño, pelo parque permite algum descanso aos pés o Bruno só dizia: 'devia ser assim até Santiago' mas naaaaaa... tem mais piada descer e subir monte e cascalho. Quase no alto de La Grajera, desesperava... o cansaço apoderavasse de mim, mas no meio de nenhures, quando não se vê sinal de alma, quando tudo parece inalcançável tem de se continuar a caminhar. Sem saber se falta muito ou pouco, o corpo sabe que tem de seguir em frente... o caminho continua.

Parque de La Grajera


Em um par de horas estávamos em Navarrete. Cansados seguimos até ao albergue municipal. Os hospitaleiros que nos receberam foram muito atenciosos (também eles peregrinos), deram-nos uma lista de albergues onde se pode ficar com donativo [mais tarde partilho]. Ficámos nas ultimas vagas do albergue. Tinha casa de banho no quarto, o que se torna menos cansativo. A cozinha era muito bem equipada e hoje preparámos arroz de marisco para o jantar. Havia uma tienda bem perto e hoje o jantar foi de categoria. Enquanto eu fazia o jantar, o Bruno lavava a roupa - é bom partilhar tarefas- Enquanto fazia o jantar, um Sr oriundo das Filipinas travou conversa comigo. Acabamos por o convidar para jantar. Partilhou connosco que iniciou a viagem com uma mochila de 18 Kg cheia de comida pré-cozinhada típica das Filipinas e na subida dos Pirenéus lá se decidiu: 'ou eu, ou a comida'. O nosso arroz de marisco deve ter sido um repasto.

quarta-feira, 17 de setembro de 2014

6º dia - Ayegui a Torres del Rio

27.6 Km de Caminhada.

Hoje íamos começar a aumentar a dose de caminhada. A maioria dos peregrinos fica em Los Arcos, mas para podermos chegar a Santiago em 29 dias, tínhamos de aumentar o número de Km diários. Aqui começámos a aumentar a fasquia. Os primeiros dias mais ligeiros tinham a intenção de preparar o corpo para umas caminhadas maiores.

Acordamos bem cedo no pavilhão poli-desportivo, fizemos o aquecimento ainda no albergue, vestimos a capa da chuva e lá iniciámos o 6º dia de caminho. Os primeiros 7 Km até Villamayor de Monjardin são sempre por terra batida. O mais chato é estar a chover (vá lá que não é chuva intensa), mas estar por baixo de uma capa faz-nos suar imenso.
Assim que vejo um bocadinho de sol, tiro a capa, mas dá uma trabalheira...

Caminho de Ayegui a Villamayor de Monjardín

Até chegar a Villamayor de Monjardin há uma subida um tanto íngreme, apesar de curta... mas só de a vislumbrar... desespero. Já vos disse que adoro subidas???

Subida até Villamayor de Monjardín

Chegando a esta pequena localidade fomos ao café, aproveitámos como sempre para carimbar a credencial ( a credencial além de permitir o acesso aos albergues, ao ser carimbada garante a Compostela, o certificado de termos feito o caminho. Os últimos 100 km, necessitam de dois carimbos diários). Aqui aproveitámos para comer algo... são 12,4 Km até Los Arcos. Enchemos as garrafas com água na fonte da localidade e seguimos sempre por estrada de terra batida. O caminho é fácil, quase sempre a direito. Uma imensa planície. Apesar de me queixar da chuva, creio que foi melhor assim. Nem imagino este caminho com sol. Poucas ou nenhumas sombras existem. Apesar de ser 12 Km sem localidades, actualmente vai existindo alguns bares com comida e refrescos pelo caminho. Apesar de ser uma fonte de lucro estes bares... posso dizer que manifestamente o caminho também é um negócio, mas  na verdade, facilitam a vida a peregrinos menos incautos.

Eu tento planear o caminho, e sei de peregrinos que levam tenda e saco-cama. Cada um faz o seu caminho. Algo que aprendi no caminho Francês é que não há 'bom' ou 'mau' peregrino. Que pode ser bicigrino ou turigrino. Tudo depende da fé, da crença, do que a pessoa se propõe a fazer. O que é de valor é a transformação. Nem que seja com passinhos de bebé.

Marco no caminho [Navarra]


Pelo caminho encontramos pequenas delicias que nos fazem sorrir e nos dão ânimo para continuar.A viagem fez-se de forma muito agradável. Eu e o Bruno falámos de tudo e de nada. Partilhamos conhecimento. E partilhámos o caminho de mão dada. 


Caminho para Los Arcos

Só parámos à entrada de Los Arcos. Nem acredito que fizemos 12 Km sem uma paragem... à entrada de Los Arcos uma pessoa abriu a garagem, colocou umas máquinas de distribuição de alimentos e temos um refúgio de peregrinos. Acho que tenho de estar grata. E fazer ver que o conforto que tenho diariamente deve ser valorizado. Em Los Arcos, comprámos finalmente selos. Eu e o Bruno no percurso até Pamplona comprámos uns postais ao 'Pedro do caminho'. Um Sr. de orvalho na barba sentado no meio da floresta e que viva da venda de postais. Mas, só hoje conseguimos selos para enviar postais à família. Á saída de Los arcos, Vê-se Sansol/Torres del Rio e são 7 Km quase a direito, vendo o próximo ponto de chegada. É sem dúvida reconfortante. 


Vista para Sansol

São duas vilazinhas separadas por um pequeno rio. Ficámos em Torres del Rio, no Albergue Privado Casa Mari. Tínhamos reservado no dia anterior. Foi o 1º albergue privado onde ficámos. Importa saber que todos os albergues do caminho, não podem ser mais do que o dobro dos albergues oficiais.   Assim, não mais do que 12 Euros, desde que apresentem a credencial.

Albergue Casa Mari
 Na Casa Mari, pagámos 7 euros e apesar de um quarto de 6 pessoas, tivemos sorte e pernoitámos sozinhos. Aqui fomos às compras num mini-mercado local e pudemos cozinhar (para não variar muito: massa com legumes e chouriço). E finalmente tomei um banho de água bem quentinha. O corpo agradece.

Saco de pano para ir as compras [bem ecológico]



terça-feira, 16 de setembro de 2014

5º dia - Puente de La Reina a Ayegui

24 Km de caminhada.

Mais um dia em que acordámos antes do nascer do sol, hoje às 5h30. Bebi logo um café em Puente de La Reina. Bem queria livrar o corpo e a mente de substâncias viciosas, mas bom... o café diário ainda se mantém. No outro dia alguém me dizia que o pior do café é que isso implica obrigar o corpo a trabalhar. E faz sentido. Vivemos a um ritmo tão frenético, onde nos é exigido mais e mais e para continuar nesse ritmo temos de o compensar com café.
Ok, ok. No caminho não seria preciso café. E não. Não existe obrigações, apenas caminhar. O pior é que de já ter esta rotina, chegam as dores de cabeça...
Sem exigências... mas talvez um dia deixe o café.

Puente de La Reina - Mosteiro


Mas bom, hoje o nascer do dia foi deveras delicioso. Adoro o tempo fresco logo da manhã. O friozinho de uma pequena localidade de interior e o raiar do sol no caminho motiva-me sempre.
O caminho foi quase sempre por terra batida até Cirauqui (7,5 km), onde parámos para um 2º pequeno-almoço. Mais uma vez o tradicional pão com doce e um café con leche de uma máquina de distribuição. Chega a uma altura que não exijo muito. Logo após termos colocado as mochilas às costas encontrámos o Paco, que carinhosamente nos chama de 'Os Portugueses'. Sorrio sempre que ele diz isto.
Instantes depois seguimos viagem. Ainda nos falta muito até Estella (cerca de 15 km), mas à qual anseio muito chegar. Dizem ser muito bonita.

À saida de Puente de La Reina

Seguimos quase sempre por terra batida e o tempo está entre o sol e a chuva. Há sempre uma dinâmica de tira e põe capas a calças de chuva. UFFF.
À chegada a Villatuerta com dores em todos os ossinhos dos pés, desespero e acabamos por nos sentar num parque de merendas. Foi deveras reconfortante tirar os ténis de caminhada e fazer elevação dos pés. Nesta posição, 5 ou 6 minutos e diminui logo o inchaço e as dores de pernas/pés. Aproveitamos para almoçar aqui. O Bruno preparou-me uma bela sanduiche de chouriço, queijinho e tomate (não há muito que optar), mas é bem mais económico comprar e fazer, do que pagar 5 ou 6 euros por um bocadillo mal-amanhado de chouriço. Enquanto o Bruno me prepara o 'almoço', sinto um calor no peito e borboletas na barriga. Não é preciso muito para me apaixonar. Basta ser. Durante quase dois anos, ele fez de tudo para me impressionar. E na verdade, o amor está nas coisas simples, no cuidar. 

Descanço em Villatuerta

Continuamos sempre por terra batida até Estella...entre conversas e parvoíces, houve momentos de riso intenso... tanto que perdi as forças e aterrei no chão de tanto rir. O caminho tem disto. 

A caminho de Estella


Marco a indicar o caminho para Estella

 Finalmente Estella e como me senti feliz aqui. A Villa é linda, mágica, com um ribeiro onde dá vontade de ficar. A minha intenção inicial era pernoitar aqui, mas pela implicação com o tempo, optámos por fazer mais 2 km e ficar em Ayegui. Mesmo assim, parámos 1h à beira rio para namorar um pouco. Ao que consta existe uma fonte de vinho, sim VINHO, para os peregrinos... mas acho que a perdemos. Eu só vim a descobrir depois, pelo que estejam atentos. 


Já era cerca das 15h quando prosseguimos até Ayegui. Bom, o albergue é uma adaptação de um poli-desportivo. O piso inferior tem algumas camas e toma-se banho no balneário, com ÁGUA FRIA!!!!Fria não, GELADA! Não tem local para cozinhar, apenas tem umas mesinhas e umas máquinas de distribuição de comida. Tem um restaurante  com um único prato disponível: Frango. Se bem que tem supermercados pertinho. O Bruno ficou logo de 'trombudo' pelas condições do albergue [mas já se sabe que é o que é] e bom, com a fome e o cansaço lá mandou vir comigo. Claro que me passei... virei costas e segui para o 'reconfortante banho'. Mas o destino tem destas coisas e ele esqueceu-se da toalha. Resultado: eu fui-lhe entregar (de esguelha) a toalha e perante a situação teve de ceder. Bem, não há como colocar à prova um amor, de que ir a situações de exaustão. 

No final do dia o Bruno disse algo que por agora ditava o nosso caminho: "ou isto rebenta, ou isto aguenta"...

24 dias faltavam para perceber...

quinta-feira, 11 de setembro de 2014

4º Dia - Pamplona a Puente de La Reina

24 Km de Caminhada.

4º dia começou com o ritual habitual, mas desta vez com enorme sorriso nos lábios. Acho que não é difícil tentar adivinhar porquê. Lavar a cara, os dentes, e prepara os pés para mais uns quantos Km diários. Normalmente os meus pés incham com o calor e a caminhada constante. Particularmente o 4º e o 5º dedo dos pés. Após uma consulta com um ortopedista, compreendi que faço microfracturas nos dedos. Ou seja, com o peso da mochila e com os km consecutivos os ossos dos pés tendem a sofrer. [isto é muito comum em militares, por exemplo, durante os treinos de campo carregam muito peso e fazem muitos km]. Assim, fui buscar o meu conhecimento como enfermeira e ao imobilizá-los com um adesivo forte ao dedo lateral o peso fica mais distribuído. Assim, todos os dias antes de calçar os ténis: Adesivo!

Dedos com Tala
Para além disso há quem faça aplicação diária de vaselina dos pés (desta vez não apliquei, mas já cheguei a aplicar e o melhor é não colocar demais para que não fique sem respirar). E nos primeiros dias aplico pomada de Diclofenac nos pés, pernas e joelhos para diminuir as dores musculares e inflamação dos tendões. Após esta preparação e a rotina costumeira partimos para o 4º dia de caminhada. Devo dizer que estava um pouco nervosa. O pai do Bruno trabalha naquela zona e viria ter connosco assim que saíssemos do albergue. Só pensava: aiiiii Deus. Ainda ontem o Bruno me pediu em namoro, que vergonha. Mas, bom por algumas dificuldades de comunicação a situação acabou por não acontecer. Um certo alívio e um certo lamento. 


Catedral de Pamplona

Acabámos por sair de Pamplona cerca das 7h00... Antes da cidade começar a acordar. A esta hora só se vê peregrinos e uns quantos cafés que servem desayunos a peregrinos madrugadores.Nós só parámos em Cizur Minor, a 1ª localidade. Até lá foi sempre por dentro da cidade e pela estrada. Aqui aproveitámos para comprar alguns alimentos para o caminho (barritas de cereais, snickers e pão) e seguir sempre até ao Alto del Perdon. "donde se cruza el camino del viento con el de las estrellas".

Na subida pelo caminho conhecemos o Paco. Um Jovem dos seus 55 anos. Ele questionou-me o que me levava a fazer o caminho... claro que é uma resposta fácil, mas ao mesmo tempo complexa. A verdade é que há uma necessidade interna, maior que eu. Muitas coisas lógicas, outras emocionais, outras espirituais. Mas uma breve resposta pode ser o início: faz-me ter esperança no mundo, na humanidade!
 
´Paisagem de Campos entre Cizur Minor até ao Alto del Perdón



Este é o meu 6º caminho até Santiago e TUdo fará crer que não será o último. A conversa com o Paco fez-se por uns quantos Km.. Paco iniciara o caminho após ter vendido a empresa e este era o tempo que precisava para saber que rumo tomar. Sabia apenas onde ia iniciar, não tinha ideia de quando ia terminar, ou onde ia passar ou pernoitar, apenas ia até onde o corpo o deixasse seguir...O caminho permite isso, não interessa o objectivo, o final... "não interessa passar pelo caminho, o que importa é que o caminho passe por nós". Paco era muito agradável e com uma passada forte... mas com ritmos diferentes, por vezes temos de deixar ir... se for para nos reencontrar, o caminho dará conta. 
Lá seguimos até ao Alto do Perdon, deixando para trás Zaraquiegui e a sua fonte de água fresca. Aqui, no Alto del Perdón aproveitámos para parar e ficar fascinados com a vista para depois descer e continuar por campos de perder de vista. O silêncio dos campos deixam-me marcas de saudades sempre que me lembro deles. Saudades e sorrisos. 

Vista do Alto del Perdón

Seguimos até Uterga sempre pelo campo. E como gostei deste local. Imaginei logo um albergue. Eu & Bruno. Não pude deixar de sorrir quando me veio esta ideia. Mas bom, mais 7 Km e estávamos em Puente de La Reina. Ficámos no Refúgio dos Padres Reparadores. O preço era pouco, 3 euros. Apesar dos em quartos serem de 12 e de se puder cozinhar... bom... a água do banho não era fria... era gelada. Assim, após os alongamentos e um banho rápido saímos para comprar comida para o Jantar. Como chegámos bem antes das 16h tivemos de fazer "tempo", pois em Espanha ainda há Siesta e as tiendas só abrem a esta hora. Hoje jantámos cedo. Ainda tive a fazer massagens com diclofenac aos pés do Bruno que estavam bastante dolorosos. Para além de aliviar a dor e a inflamação, a massagem ajuda na drenagem dos pés. Antes de dormir há que colocar uma manta/almofada por baixo do colchão para que os pés no dia seguinte estejam como novos (ou quase).

terça-feira, 9 de setembro de 2014

3º dia - Zubiri a Pamplona

22 Km de caminhada.

Mais um dia para acordar cedo. O pior foi ter de ir a casa de banho do outro lado do pátio da escola. Acordar as 5h30 da manhã é sinal que está muitoooo frio. Mas levei logo as coisas para a cozinha, para não ter de entrar e sair do quarto. Para mim é fundamental garantir que os outros peregrinos não sejam incomodados quando eu acordo cedo. Aquele abre zipper, fecha zipper, abre velcro, fecha velcro. Lanternas a bombar que mais parece uma discotecas, são lamentáveis. E uma falta de respeito para quem tenta recuperar de uma caminhada. Assim de noite, antes de dormir, deixo tudo dentro da mala, mesmo que não esteja totalmente arrumada. De manhã levanto-me e levo tudo para a área comum, onde calmamente tiro o que necessito para a casa de banho,para o pequeno-almoço e deixo o possível arrumado. Assim, depois das rotinas matinais, do pequeno-almoço com saquetas de Cappuccino e pão do dia anterior com o resto da marmelada e o aquecimento habitual lá partimos caminho fora. O dia estava de nevoeiro e é divinal apreciar cada momento que a natureza nos propicia. Ainda mais fazê-lo com o Bruno. Acho que torna tudo ainda mais emocionante.


O orvalho nas folhas, o nevoeiro a levantar e a fazer vislumbrar o contraste de cores com o sol é de cortar a respiração. A primeira paragem é Larrasoaña, logo a 5km de Zubiri, mas hoje, por termos chegado bem cedo, continuámos mais um pouco até Trinidade de Arre. Uma localidade pequena. Tem alguns albergues privados e um café/mercearia, onde parámos para o café con leche (que não dispenso) e para nos abastecer de Pão e massa e polpa de tomate (é o prato mais cozinhado por mim no caminho) para fazer em Pamplona. O Bruno, tinha sido avisado pela Andreia que no caminho só era isto. E ele apenas estava habituado às nossas caminhadas de preparação (em Sintra), onde cada um ia jantar a casa.

Segundo a dona do café era dia de festa em Pamplona e provavelmente estaria tudo fechado. E lá fomos nós com mais 1kg, cada um, na mochila de comida para fazer ao jantar.


O dia e o caminho foi fácil. O tempo estava fresco, o caminho tinha poucas subidas e o caminho até Pamplona foi quase todo feito por entre vegetação densa que corria junto a um rio. Até agora a parte mais bonita do caminho. Parámos só por volta das 12h numa clareira para comer uma sandes de omelete (feita de manhã). O Bruno aproveitou para me fotografar. Mas no caminho, tenho sempre um ar tão masculino... ai... fiz um esforço... :p claro que coloquei defeitos. Acho que quanto mais gosto da pessoa, mais me torno exigente.


Logo continuamos, pelo mesmo caminho junto ao rio, até à chegada a Pamplona que foi rápida. Na chegada a Pamplona optámos por ficar logo no Refúgio Padreborn, logo à entrada da cidade, mas por só ter  24 camas, estas foram rapidamente ocupadas e... já cansados arrastámo-nos até ao centro da cidade de Pamplona.

Já estava um pouco irritada por ter que andar mais um pouco. Mas calei-me. Já sabia que mais valia controlar-me. O Bruno, teria muitos dias para me aturar. E ainda era só o 3º dia. Chegámos ao de Jesus e Maria e o melhor!... ERA TUDO PONTES! Eu já disse que tenho vertigens? E é que não são poucas. Aquele albergue é construído num antigo seminário, e como tal, tem um pé-alto que foi aproveitado para 2 pisos. O medo fez-me desatar a chorar... ter que dormir num 2º piso, e atravessar "pontes envidraçadas" foi de mais... o cansaço apoderou-se de mim e o choro também. O Bruno abraçou-me. Sabia do meu medo e tentou acalmar-me. Foi sem dúvida reconfortante e fi-lo prometer que ia comigo para todo o lado daquele albergue.

Só mesmo alguém muito próximo para compreender este meu medo.

No meio desta minha dificuldade, tomámos banho, tentámos secar a roupa numa máquina de secar (pois estava a chover)... e para não ter de sair do meu cantinho, o Bruno ia sempre ver da máquina. O meu coração sorria por cada vez que ele me tentava acalentar. Fomos fazer o jantar cedo =D massa com tomate e por estarmos em Pamplona aproveitámos para ir um típico bar espanhol para uma cerveja (o meu parceiro de viagem, eu, claro, um Aquarios para repor os electrólitos. Ainda fomos a correr para o Albergue, para além de estar quase a fechar... estava a chover... entrámos no albergue e subimos ao temível 2º piso. O Bruno abraçou-me ao chegar ao beliche. Pedi-lhe para me fazer companhia até adormecer anuiu e num reconfortante beijo disse-me: queres namorar comigo? O meu coração começou aos pulos. SIM, CLARO QUE SIM. Já o desejava há muito e foi preciso estes Km para começar a viver um bonito romance. Posei o meu rosto em seu peito e ali fiquei até adormecer...

domingo, 7 de setembro de 2014

2º dia - Roncesvalles a Zubiri

21.5 Km de caminhada.

O 2º dia de caminhada começou novamente cedo. Tivemos de comprar qualquer coisa nas máquinas de distribuição do albergue para o Pequeno-almoço (Não nos tínhamos provido de forma conveniente e o percurso até Roncesvalles também não é rico em paragens). Após uma refeição para nos dar força os preparativos para sair. Hoje o tempo está chuvoso. Bem nos serviram os ponchos e calças impermeáveis que nos pesam na mochila. Lá temos que andar com mais 1kg na mochila... mas com um mês de caminho, temos de nos munir de material que nos permita continuar a caminhar. 

Iniciámos o caminho perto da estrada num sendero de peregrinos. Regressámos aos bosques sempre acompanhados pela chuva. Só 6,4 Km a 1ª e única paragem antes de Zubiri é que descansámos. Os primeiros dias de viagem (para quem já tem alguma experiência) são sempre os mais fáceis. O cansaço ainda não está acumulado. Para quem é principiante, os três primeiros dias são os mais difíceis. Assim, parámos em Espinal, tomámos o segundo pequeno-almoço (o meu café con leche e pan com matequilla) e comprámos pão para os próximos 15 km. 




Continuámos sempre pelos bosques. Pelo caminho reencontrámos o Alessandro =) e ainda bem que assim foi. Como ele disse fomos o milagre número 3. Como ele nos veio a explicar mais tarde, ele partiu para o caminho sem estar à espera de o fazer. Foi visitar a irmã e pelo meio decidiu que deveria fazer parte do caminho. À chegada a Roncesvalles não tinha nenhuma manta, ou saco-cama e aqui houve o 1º milagre. No albergue providenciaram um saco-cama para a noite. O 2º milagre foi quando saiu do albergue e estava a chover. Alessandro teria de parar a caminhada pois não vinha preparado para tal e ou alguém lhe emprestava um poncho, ou o caminho para ele terminaria ali. Para boa surpresa dele, alguém conseguiu fornecer-lhe um poncho e o regresso ao caminho não tardou. O 3º milagre fomos nós que lhe proporcionámos. Já o caminho ia longo, mas ainda a 7 ou 8 km de Zubiri, Alessandro sentiu que as forças começavam a surgir, foi quando nos encontrou e sem sabermos lhe oferecemos maçãs e barritas de cereais. Este foi o encontro com o 3º milagre. "O caminho dá que precisamos, não o que queremos". Este foi um dos primeiros ensinamentos nos primeiros passos a Santiago e mais uma vez o constato. 


O caminho fez-se sempre com chuva e lama, mas por outro lado foi melhor assim, é mais fresco. Chegámos cedo a Zubiri, perto tas 15h. O Albergue é uma antiga escola primária que foi adaptada a albergue municipal, com cerca de 40 camas e espaço no ginásio para colchões. Aqui existem alguns albergues privados, mas sempre que possível ficamos nos públicos por serem mais baratos. Este foi 4 euros. Tinha cozinha, com uma mercearia a poucos metros, padaria perto bem como alguns cafés. O único inconveniente do albergue municipal é a casa de banho e cozinha serem do lado oposto do pátio ao local dos quarto.

Após o banho para retemperar as forças, a lavagem à mão da roupa, saímos para comprar comida, descansámos um pouco e fizemos o jantar. Convidámos o Alessandro para jantar connosco, digo, convidei o Alessandro a jantar connosco e ele anuiu... No decorrer do jantar ele pediu-me para ser fotografada. Tenho um sentimento secreto que o Bruno sentiu algum desconforto. Será?
 
Depois do jantar... uma caña, os 3, num bar próximo e em pouco tempo estávamos de novo nos tão desejados beliches para o descanso do guerreiro.